segunda-feira, outubro 29, 2007

TROPA DA ELITE



Ingênuos que lêem Foucault

Heróis que empalam garotos

Toda ajuda é hipócrita

Tortura é a solução

Morte à alteridade

Aplausos histéricos à autoridade

Dos caminhos o mais curto,

o mais fácil.

Fácil?

Desde que não atrapalhe o trânsito

e que não manche de sangue

os nossos sapatos, calçadas e filhos.

E desde que não perturbe nossas refeições.

Não nos embrulhe os estômagos

com a desagradável visão desses

pretos,

pobres,

sujos e maus

garotos estraçalhados.


Quem somos nós?


Pretensa elite que goza o mundo

e que cheia de medo

assina cheques, contratos e penas.

Elite que, cheia de dentes, berra:

Paz!

Justiça!

Honra!

Basta!

Basta de tiros em nossos quintais,

de mendigos em nossas calçadas,

de malabaristas em nossas esquinas.

Paz

no asfalto

na escola

no shopping.

Paz, no morro, engatilhada

Cano ainda quente

sujo de saliva e medo.


Pobreza pacificada,

silenciada até o próximo carnaval.


Salve a liberdade burguesa,

a invisibilidade do outro,

os gritos que não descem o morro!

Um viva aos novos heróis da pátria

com seus uniformes negros!

Carrascos com carteiras assinadas.

Durmamos em paz

e deixemos pra eles a honrada missão

da manutenção desse nosso gozo infindável...

segunda-feira, outubro 01, 2007

Três passos para uma guerra


I - O NEONIILISMO
Tempos de pensamento único. Entretanto disfarçado, maquiado, siliconado, sedutor. Ele se apresenta: “Nunca houve tamanho fluxo livre de idéias e saberes.” Mas então qual o motivo de tantos concordarem? “Porque é o sensato a se fazer” - responde. Mas isso é somente o cinismo da mentalidade hegemônica, que aprendeu a tudo absorver e anular. Então, ele adverte: “Não há mais espaço para revolução. Os que conseguirem se manter menos contaminados pelas idéias dominantes se tornarão outsiders, figuras periféricas vistas como párias, loucos, incompetentes, improdutivos, inadequados, irrelevantes.”
Por isso, a sensação de impotência frente a um mundo que parece permanecer impassível aos protestos, às críticas, ao inconformismo. Assim, as revoltas vão sendo abortadas antes de tomarem forma. O desânimo atinge o peito e as potencialidades de idéias livres são sufocadas. As melhores mentes e os espíritos mais sensíveis de nosso tempo são empurrados para um neoniilismo, e este é um terreno instável e perigoso; berço da violência dirigida ao próximo e a si mesmo.

II – AS MÁSCARAS PARTIDAS
Só que até a sensação de impotência nada mais é do que produto dessa indústria que nos traga. A história mostra que, um a um, cada paradigma inquestionável foi violado e humilhado quando o tempo certo chegou. Nada do que criamos é eterno. Tudo é mutável e frágil, por trás das impressionantes máscaras. Fortes não eram os impérios teocráticos, as propriedades feudais, a razão eurocêntrica ou a “superioridade” ariana. Forte é o homem que criou cada uma dessas terríveis fantasias, pois só ele tem o poder de destruí-las.

III – O CAMPO DE BATALHA
Se a ditadura do mercado, se a indústria onívora, são criações humanas, então não somos nós que temos que nos ajoelhar. O discurso onipresente, que a todo custo busca nos aliciar ou esmagar, sempre apresentará a realidade como forte e estruturada demais pra ser combatida. Mas isso é mentira. A mentira que sustenta a dominação de tão poucos sobre tantos. Que ao nos calar nos torna cúmplices. Que turva a visão, nos fazendo apontar dedos acusatórios para as vítimas. Mentira que nos torna assassinos. Culposo ou doloso, não importa, é crime de morte. Temos mais poder em nossas mãos do que querem que acreditemos. Cada recusa tem seu valor, cada ato tem sua conseqüência. Pequenas rupturas podem provocar impensáveis deslocamentos. Um dia uma negra se recusou a ceder seu lugar em um ônibus. Um dia um jovem judeu alemão transformou filosofia em arma. Um dia decidimos dizer não; deixamos as mãos sujas de sangue, pois acordamos para o fato de que lavá-las, como sempre fazemos, é ato abominável e covarde.