“Na era pós-moderna, enquanto a figura do povo se dissolve, o militante é o que melhor expressa a vida da multidão: o agente de produção biopolítica e de resistência ao Império. Quando falamos de militante, não estamos pensando em nada parecido com o triste, ascético agente da Terceira Internacional, cuja alma estava profundamente permeada de razões de estado soviéticas, da mesma maneira que a vontade do papa estava cravada nos corações dos cavaleiros da Companhia de Jesus.”
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“Hoje, depois de tantas vitórias capitalistas, depois que as esperanças socialistas murcharam em desilusão, e depois que a violência capitalista contra o trabalho foi solidificada sob o nome de ultraliberalismo, por que essas instâncias de militância ainda surgem, por que as resistências se aprofundam, e por que a luta reemerge continuamente com novo vigor? Deveríamos dizer, de imediato, que essa nova militância não repete simplesmente as fórmulas organizacionais da velha classe operária revolucionária. Agora o militante não pode sequer fingir ser um representante, mesmo das necessidades humanas fundamentais dos explorados. A militância política revolucionária hoje, ao contrário, precisa redescobrir o que sempre foi sua forma própria: atividade não representativa, mas constituinte. A militância atual é uma atividade positiva, construtiva, inovadora. Esta é forma pela qual nós e todos aqueles que se revoltam contra o domínio do capital nos reconhecemos como militantes. Militantes resistem criativamente ao comando imperial.” (...) “Essa militância faz da resistência um contrapoder e da rebelião um projeto de amor.”
“Há uma lenda antiga que pode servir para iluminar a vida futura da militância comunista: a de São Francisco de Assis. Examine-se a sua obra. Para denunciar a pobreza da multidão ele adotou essa condição comum e ali descobriu o poder ontológico de uma nova sociedade. O militante comunista faz o mesmo, identificando na condição comum da multidão sua enorme riqueza. Francisco, em oposição ao capitalismo nascente, recusou todos os instrumentos de disciplina, e em oposição à mortificação da carne (na pobreza e na ordem constituída) propôs uma vida de alegrias, incluindo todos os seres e a natureza, os animais, a irmã lua, o irmão sol, as aves do campo, os humanos pobres e explorados, juntos contra a vontade de poder e corrupção. Mais uma vez na pós-modernidade, encontramo-nos na situação de Francisco, propondo contra a miséria do poder a alegria do ser. Esta é a revolução que nenhum poder controlará – porque o biopoder e o comunismo, a cooperação e a revolução continuam juntos, em amor, simplicidade e também inocência. Esta é a irreprimível leveza e alegria de se ser comunista.”
(Trechos finais do livro Império, de Antonio Negri e Michael Hardt)