terça-feira, junho 24, 2008

Aos novos idiotas da objetividade

O louco Nelson, trajando seus vestidos de noiva e vislumbrando beijos no asfalto, teve tempo e paciência de nos precaver contra os idiotas da objetividade, contra o copydesk - o cretino burocrata escravo da gramática da língua e também da gramática das relações de poder nas redações.


O tupiniquim maltrapilho idólatra da estúpida cultura do jornalismo estadunidense bradava: “Nada de adjetivações! Seja imparcial, seja objetivo! O bom repórter deve ser invisível!”.

Nelson, em resposta, apenas ria da vida ser como ele é. Ria por perceber como pequenos idiotas acumulavam grandes poderes e levavam a sério a pornochanchada que constituía seus reinados.

Os novos idiotas da objetividade não ocupam mais o praticamente extinto cargo de copydesk nas redações de nossos jornais. O diretor de redação não precisa mais do burocrata gramatical, pois hoje os repórteres já vêm domesticados de casa: subjetividades criadas, desde o nascimento, por nossas grandes figuras midiáticas, filhos da Globo e da Veja, felizes ruminantes de idéias pré-fabricadas e frases prontas, formados por faculdades de pedagogia tecnicista que ensinam a fazer um lead, mas os proíbem de pensar.

Hoje, quase todo cidadão tem um pouco de copydesk e teme e odeia os loucos parciais, passionais, tendenciosos que ousam dizer que o rei está nu e de pau duro e pronto pra meter na bunda de quem se curvar. Nosso cidadão-copydesk prefere seu existir anódino e falar de flores; mas, vejam bem, falar imparcialmente das flores, pra que ninguém se ofenda. As podres bases de suas vidas metrificadas, gramaticalmente corretas, seguras e cinzas, são abaladas a qualquer ruído autônomo, parcial e que assuma suas posturas e posições publicamente.

Os idiotas da objetividade contemporâneos, em uníssono, então, gritam: “Você é tendencioso até não mais poder, te odiamos!”. E como os idiotas da objetividade são o que são, meros pobres coitados de calças arriadas, se vêem ignorados, batem o pé, fazem bico, se descabelam e por fim suspiram sem forças: “Maldito engajado, queremos que nos deixe em paz com a objetividade de nossas vidas amorfas! Queremos a segurança de uma velhice tranqüila decorada com versos sobre amores, com belas rimas ricas e vazias. Por favor, nos deixe...”. Como se suas pobres rimas ricas sobre o nada de suas vidas supérfluas não fosse o que há de mais tendencioso, como se suas frases alienadas não servissem ao rei nu e excitado, como se a escrita e as idéias pudessem obedecer às leis dos cientistas que mandam que toda experiência, se repetida sob as mesmas condições materiais, deva apresentar os mesmos resultados em qualquer laboratório.

Nossas mentes deveriam ir muito além de nossos confortáveis e seguros quartos/laboratórios e nossas vidas deveriam servir a muito mais do que à luxúria dos reis. Pobres idiotas da objetividade são os mais tendenciosos de todos os seres, a diferença é que seguem felizes uma tendência que não nasce em seus peitos, mas no mercado.

Os idiotas são objetivos e livres: livres do fardo de pensarem por si próprios.